Em Jurado nº 2, um drama moral sobre a imperfeição da justiça 

Faith Killebrew (Toni Collette) e Eric Ressnick (Chris Messina) mantêm uma relação até bem amigável, para quem se enfrenta regularmente no tribunal.
Ela é promotora. Ele é o advogado a que a corte recorre para representar réus sem condições de custear a defesa.
Os dois costumam beber juntos depois do expediente. Em uma dessas ocasiões, o advogado ergue o copo de bourbon e propõe um brinde que sua ex-colega de faculdade aceita com alguma reticência: “Ao sistema judicial. Ele não é perfeito, mas é o que temos.”
 Disponível na plataforma Max, Jurado Nº 2 (Juror#2), dirigido com a inigualável clareza narrativa de Clint Eastwood, disseca as imperfeições que se acumulam em um julgamento de homicídio.
Jurado Nº 2 paga tributo a 12 Homens e uma Sentença, um clássico do cinema jurídico, mas a ação não transcorre inteiramente na sala do júri, como ocorria no filme de 1957.
O centro nervoso da história está nas deliberações dos jurados – que, longe de se empenharem no exame imparcial dos fatos, deixam-se levar por idiossincrasias e ideias pré-concebidas. Há até quem queira fechar o veredicto o mais cedo possível para voltar a seus afazeres cotidianos.
O grande dilema ético da história pesa sobre o jurado número dois, Justin Kemp (Nicholas Hoult), jornalista de uma revista local. No primeiro dia de julgamento, ao ouvir a descrição do suposto homicídio de que o réu é acusado, Justin descobre que ele mesmo talvez tenha causado, acidentalmente, a morte da vítima.
Com um roteiro menos apurado e um diretor menos firme, uma coincidência trágica dessa monta seria implausível. Em Jurado Nº 2, ao contrário, de imediato compartilhamos da angústia de Justin – e talvez até de seu sentimento de culpa. É o típico filme do qual saímos nos perguntando: “o que eu faria no lugar do personagem?”
Os fatos do caso parecem apontar para a culpa do réu. Tal como é apresentado pela promotoria, o acusado, James Michael Sythe (Gabriel Basso), é um homem violento que matou a namorada com quem mantinha uma relação abusiva.
Na noite da morte de Kendall Carter (Francesca Eastwood, filha do diretor), Sythe foi visto discutindo com ela em um bar de beira de estrada. De acordo com a versão da promotoria, ele perseguiu Kendall depois que ela deixou o bar decidida a encerrar a relação – e a matou, de acordo com o legista, com um só golpe de um instrumento pesado. O corpo foi encontrado no dia seguinte, sobre as pedras abaixo de uma ponte.
Justin estava no mesmo bar naquela noite. De uma mesa discreta, viu o barraco do casal. E saiu do local pouco tempo depois, de carro, em uma noite de chuva forte. 
Todos esses fatos são revelados lá pelos 15 minutos de Jurado nº 2. Ainda assim, a tensão será permanente até o fim do filme. O espectador teme que em algum momento a promotora, o advogado e os demais jurados descubram a ligação de Justin com os eventos daquela noite. Mais importante, quer saber como o jurado número 2 agirá a partir de então. 
Há ainda um complicador doméstico na vida de Justin: sua mulher está nas semanas finais de uma gravidez complicada. Péssima hora para arranjar enroscos com a Justiça.
Ao que tudo indica, este será o último filme de Clint Eastwood. Aos 94 anos, o ator que conquistou a fama como o “estranho sem nome” dos faroestes de Sergio Leone e como o policial durão Dirty Harry alcançou um lugar entre os grandes diretores americanos, assinando obras-primas como Os imperdoáveis e Sobre meninos e lobos. 
A Warner decidiu não distribuir Jurado Nº 2 nos cinemas para cortar despesas de marketing (o custo de produção, aliás, foi modesto para os padrões dos grandes estúdios: em torno de US$ 35 milhões). Nos Estados Unidos, o filme foi exibido em apenas 50 salas e logo entrou no Max.
É uma pena. Poderoso drama moral, Jurado nº 2 merecia a tela grande. É um raro filme no qual as falhas do sistema legal não são motivadas pelas razões torpes de sempre – abuso do poder político e econômico, corrupção policial, racismo.
Quase todos os personagens agem de boa fé, e mesmo assim cometem erros graves. A justiça é imperfeita porque é humana.
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